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Carlos Alberto Cagnolati, uma unanimidade

Por dr. José Abelardo Garcia de Meneses

Quatro dias. Apenas quatro dias separam as perdas de dois grandes amigos, dois estudiosos da Medicina e da Anestesiologia. Na quarta-feira Onofre Alves Neto e neste domingo, 11 de julho, nos deixa Carlos Alberto Cagnolati, aquele que para muitos foi como um pai, um irmão um pouco mais velho, um conselheiro, um porto seguro nas dificuldades diante dos casos mais bizarros a serem enfrentados.

Muito mais do que um preceptor, corresponsável pelo CET-Santa Casa de Ribeirão Preto, “Carlão”, como sempre foi carinhosamente aclamado, sempre foi o apoio na sala de cirurgia e de recuperação pós-anestésica nos pós-operatórios mais difíceis.

>Leia a nota da SBA

No final dos anos 1970 os grandes nomes da Anestesiologia em Ribeirão Preto eram Rubens Lisandro Nicoleti e José Roberto Nociti. Buscávamos Ribeirão Preto pelos nomes e histórias dos dois, mas lá encontrávamos também o Carlão. Com ele conseguíamos muito mais do que ensinamentos em Anestesiologia. Exemplifico: para alugar um imóvel àquela época era preciso mais do que ter o nome limpo na praça, daí surgia o garantidor, o fiador, dr. Carlos Alberto Cagnolati.

Os mais antigos e os mais estudiosos devem estar lembrados do célebre artigo “Física para o Anestesiologista”, publicado na RBA (nº 5, 1980). Apesar dos seus conhecimentos em medicina e anestesiologia Carlão, do alto de sua simplicidade, jamais aceitou destaque. Como se diz popularmente, ele funcionava bem, muito bem, no Centro Cirúrgico, nos bastidores, acompanhando pari passu os médicos em especialização. Pegando na mão de cada um para ensinar detalhadamente do acesso venoso periférico, aos acessos profundos ainda na era anterior aos modernos cateteres, à utilização do ultrassom e à monitorização. Da peridural aos bloqueios periféricos, sempre com muita paciência estava ele lá para orientar.

Carlão deixa seu legado de correção em suas atitudes. Foi para seus residentes o exemplo em sala de cirurgia, respeitando cada paciente como ser único, mantendo a calma quando algo estivesse a requerer decisões serenas, firmes e seguras. Por isto mesmo cultivou a admiração e respeito dos anestesiologistas e dos cirurgiões que o procuravam para anestesiá-los, quando necessário, e a seus entes queridos.

Guardo como relíquia do meu amigo Carlos Alberto, como costumava chamá-lo, uma placa para medir PAM com o cachimbo de vidro, que me foi muito útil até surgirem os modernos monitores ultrassofisticados.

Lembro do nosso primeiro dia no CET, 02 de janeiro de 1980, um dos colegas adiantou-se para dizer a Carlão que era inexperiente, nunca tinha feito nenhuma anestesia, ao que prontamente o italiano disse-nos, “melhor assim, porque não chega com vícios”.

Não. Nelson Rodrigues não está certo, pelo menos em relação a Carlos Cagnolati, posto que com ele a unanimidade é verdadeira. Pelo menos com Carlão a unanimidade não é burra, disso tenho certeza. Desconheço um ex-residente seja do HC/USP-Ribeirão Preto, onde era contratado, ou da Santa Casa que não continue seu amigo, não lhe seja muito grato, não seja um admirador e não esteja sentido a sua partida. Neste caso a unanimidade é unânime, vale a redundância, vem compreensivelmente da gratidão.

Convivi nos dois anos do CET e mais dois quando residi em Piracicaba-SP, com as famílias Bredariol e Cagnolati. Sua esposa Jane, seus filhos Carlos André, Samuel Carlos e Daniel Carlos, dos quais dois anestesiologistas, seus pais, sogros e cunhados. Fui acolhido e guardo gratidão pelo carinho e amizade de todos.

Lembrando de João Guimarães Rosa em seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras (ABL) “As pessoas não morrem, ficam encantadas… a gente morre é para provar que viveu.”

E assim o dr. Carlos Alberto Cagnolati ficou encantado. Até outro dia meu amigo