Luis Antonio Diego
Diretor do Departamento de Defesa Profissional da SBA
Você sabe o que é o Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)?
O sistema de saúde complementar
adota, desde 1998, o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde o qual vem sendo,
desde então, atualizado por diversas novas Resoluções, sejam Normativas ou
Resoluções da Diretoria Colegiada (RDC) da ANS. O Rol de Procedimentos foi
estabelecido pelo Conselho de Saúde Suplementar (CONSU) com o objetivo de
estabelecer e normatizar a cobertura assistencial obrigatória a ser garantida
pelos planos privados de assistência à saúde, sejam aqueles anteriores
adquiridos antes de 1999, ajustados posteriormente em conformidade com o Art.
35 da Lei nº 9656 de 1998, ou aqueles comercializados a partir de então e
estabelecendo a cobertura mínima a ser observada em quaisquer das segmentações
existentes, como a ambulatorial, hospitalar e atendimento obstétrico, além
daqueles definidos como de alta complexidade.
A título de esclarecimento, é
importante relembrar que o Coeficiente de Honorários (CH) existente nas
diversas tabelas da década de 1990 foi extinto em 1996 por sugerir um processo
de cartelização e não apenas de referência para a remuneração dos
procedimentos.
A evolução da prática médica
impõe atualizações periódicas e para tanto, há que se promover um permanente
processo de incorporação tecnológica baseada nas melhores evidências de
segurança e eficácia, mas também a exclusão de tantas outras que se tornaram
obsoletas. Considerando essa necessidade, de melhor organizar esse processo, a
Associação Médica Brasileira (AMB) contratou a Fundação Instituto Pesquisas
Econômicas da Universidade de S. Paulo (FIPE) no início dos anos 2000 para
coordenar o processo de desenvolvimento de uma classificação que melhor
ordenasse os métodos e procedimentos existentes, quer na área diagnósticas,
quer de intervenções terapêuticas, considerando as diferenças existentes na
complexidade de cada ato. Em maio de 2003, durante o Encontro Nacional de
Entidades Médicas (ENEM) realizado em Brasília, a Classificação Brasileira Hierarquizada
de Procedimentos Médicos (CBHPM) foi apresentada e definidas estratégias de
implantação e logo em julho do mesmo ano foi oficialmente publicada como
projeto piloto. Importante ressaltar que em julho do ano seguinte (2004) a AMB
já estava lançando a sua 3ª Edição com 3.963 procedimentos.
Em 2008, a Instrução Normativa ANS nº
30 [i] determinou que as operadoras de planos privados de
assistência à saúde e prestadores de serviços de saúde deveriam,
obrigatoriamente, adotar a Terminologia Unificada em Saúde Suplementar para
codificação de procedimentos médicos (TUSS), para facilitar a troca de
informações entre os prestadores e as operadoras de planos de saúde em relação
aos procedimentos assistenciais que eram disponibilizados para os
beneficiários. Essa normativa foi motivada pela enorme desconformidade nas
terminologias adotadas pelas diversas operadoras, dificultando, principalmente,
a implantação eletrônica de troca de informações e foi fruto do trabalho do
Comitê de Padronização das Informações em Saúde Suplementar (COPISS) que ficou
responsável por compatibilizar a codificação e a nomenclatura entre o Rol de
Procedimentos da ANS e a CBHPM para vir a ser utilizada como Troca de
Informações em Saúde Suplementar (TISS). Contudo, é importante ressaltar
que a CBHPM e o Rol de Procedimentos são distintas, cada uma com suas funções
específicas e há procedimentos que constam na CBHPM, mas não são contemplados
no Rol da ANS. Existe, entretanto, uma planilha comparativa entre a TUSS e o
Rol no site da ANS[ii]. A
Resolução Normativa nº 470/2021, publicada a 09 de julho de 2021, dispõe sobre
o rito processual de atualização do Rol da ANS (Figura 1)[iii]
trazendo importantes alterações, inclusive nas Propostas de Alteração do Rol
(PAR), que são recebidas e analisadas de forma continua pela Diretoria de
Normas e Habilitação dos Produtos (DIPRO) e semestralmente atualizadas no Rol
após o rito processual.
(Figura 1: Rito processual de atualização do Rol)
Rol Taxativo x Rol Exemplificativo
Recentemente,
dia 8 de junho de 2022, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que o
Rol da ANS para a cobertura dos planos de saúde passasse a ser considerado
taxativo (sem margem para negociações), e não mais exemplificativo, ou seja,
com essa decisão as operadoras não mais seriam obrigadas a cobrir
procedimentos, cirurgias e medicamentos não listados no Rol, o qual, até então,
era considerado como uma referência de cobertura mínima pelas operadoras, sem
restringir direitos dos beneficiários.
Com
essa determinação do STJ, o plano de saúde não é mais obrigado a custear
tratamentos não previstos no Rol se já existe alguma outra forma de
procedimento eficaz e seguro listado no Rol. Entretanto, algumas possibilidades
ainda permanecem sob a forma de “taxatividade mitigada”, ou seja, se cumpridos
alguns requisitos, a reivindicação poderá ser aceita. Assim, desde que a ANS
não tenha indeferido o procedimento anteriormente, o paciente/médico poderá
reivindicar a cobertura desde que haja comprovação da eficácia do tratamento “à
luz da Medicina Baseada em Evidências – BEM”; recomendações de órgãos técnicos
de renome, nacionais e internacionais e perícias nas demandas judiciais.
A anestesiologia e a inclusão no Rol dos Procedimentos
A
anestesia está presente na CBHPM com os portes anestésicos que são elencados
para cada procedimento (código) hierarquizado. A questão é que o ato anestésico
está presente em todas as especialidades cirúrgicas e muitos procedimentos
diagnósticos, dentre outras possibilidades e terapias (Dor, p. ex.). A
multiciplidade no atendimento assistencial requer muita atenção no momento que
cada novo procedimento/cirurgia/intervenção for fizer parte da PAR (Proposta de
Atualização do Rol) para que não haja descompasso na hierarquização prevista na
CBHPM.
A
AMB emitiu, recentemente, uma nota se posicionando sobre a questão[i]: “…. Este entendimento
prejudica o consumidor e, com certeza, levará a mais processos judiciais. Além
disso, a decisão pode afetar a autonomia médica. Os médicos não poderão
considerar a individualidade dos pacientes para indicar o tratamento mais
adequado à sua condição, interferindo, assim, na condução de cada caso.”
A
Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA) também está atenta a todo esse
processo e junto com a AMB observando o desenvolvimento prático da medida e se
sempre se posicionando a favor da Segurança do Paciente e o direito do médico
em prover ao paciente o tratamento mais adequado e eficaz.
[i]
AMB. Acessível em: STJ
decide que rol de cobertura de procedimentos da ANS é taxativo – AMB
[i]
Acessível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/ans/2008/int0030_09_09_2008.html
[ii]
Acessível em: http://www.inb.gov.br/manual_pmo/rol_correlacaotuss_2021.pdf
[iii]
Ministério da Saúde. Acessível em: Atualização
do Rol de Procedimentos — Português (Brasil) (www.gov.br)