Notícias Orientação Ozempic anaesquiavo setembro 19, 2024 Compartilhe O diabetes mellitus (DM) é uma das doenças crônicas priorizadas em nível global. Seu impacto inclui elevada prevalência, importante morbidade decorrente de complicações agudas e crônicas, além de altas taxas de hospitalizações e de mortalidade, gerando significativos danos econômicos e sociais1,2. Estima-se que o DM tenha causado 4,9 milhões de mortes no mundo em 2014, sendo responsável por 11% do gasto total com a saúde em adultos: um custo estimado de 612 milhões de dólares 3. No Brasil, essa enfermidade foi responsável por 5,3% dos óbitos ocorridos em 2011, com taxa de mortalidade de 33,7 óbitos a cada 100 mil habitantes 4. Sua prevalência está aumentando rapidamente e prevê-se que até 2030, 1 em cada 10 pessoas seja afetada pela doença 1. Além disso, cerca de 15% da população perioperatória tem diabetes, tornando importante que os anestesiologistas estejam familiarizados com a doença e seu manejo5. O DM tipo 2 é responsável por 90% dos casos e decorre do aumento da resistência periférica à insulina, com sua subsequente deficiência relativa. Embora as intervenções no estilo de vida e na dieta sozinhas possam ser suficientes, particularmente no início da doença, a maioria dos pacientes requer intervenção farmacológica 5. Uma ampla gama de medicamentos antidiabéticos está disponível recentemente, não apenas com efeitos redutores da glicemia, mas também atuando na proteção cardiorrenal e no tratamento da obesidade. Dentre esses fármacos, destacam-se os agonistas do receptor do GLP-1 (Glucagon-like peptide-1) 5. Esta classe de medicamentos inclui: dulaglutida, liraglutida e semaglutida. Eles exercem seu efeito antidiabético aumentando a secreção endógena de insulina, inibindo a secreção de glucagon, retardando o esvaziamento gástrico e aumentando a saciedade. Esses fármacos estão disponíveis como preparações subcutâneas, as quais são tomadas diariamente ou semanalmente. Uma formulação oral de semaglutida está disponível, com tomada diária 5. Os agonistas de GLP-1 reduzem a HbA1c em aproximadamente 1% e apresentam baixo risco de hipoglicemia. Além disso, também podem reduzir os eventos cardiovasculares, doenças renais e mortalidade em pacientes com DM2 5. O uso desses fármacos tem ganhado especial interesse, principalmente pelo seu efeito na perda de peso em pacientes com e sem diabetes. Liraglutida e semaglutida foram licenciados para o tratamento da obesidade na população não diabética por meio de serviços especializados em controle de peso 5. Devido aos seus efeitos gastrointestinais, em particular náuseas/vômitos, decorrentes de um retardo do esvaziamento gástrico e potencial risco de broncoaspiração durante os procedimentos que envolvam sedação e anestesia geral, algumas considerações merecem atenção especial quanto ao seu uso no contexto perioperatório. A seguir, estão resumidas algumas das evidências mais atuais sobre o tema. Fundamentação Sumário de evidências:-Um estudo retrospectivo conduzido por Silveira e col. com 404 pacientes submetidos a esofagogastroduodenoscopias (EDA) e colonoscopias, sendo 33 em uso de semaglutida nos últimos 30 dias (a maioria para tratamento de obesidade) e os demais sem uso de semaglutida ou análogos de GLP-1 no período. Foi encontrado um risco 5,15 vezes maior de presença de resíduos gástricos (24,2% dos pacientes) e 3,56 vezes maior para sintomas digestivos em pacientes em uso de semaglutida (27,3% dos pacientes), naqueles submetidos à EDA isolada. Já em pacientes que realizaram colonoscopia em conjunto, contraditoriamente, este risco foi 4 vezes menor, levantando a hipótese de que a mudança da dieta para uma dieta líquida sem resíduos no dia anterior possa ser uma alternativa a ser estudada nestes pacientes. Dentre estes casos, o único que apresentou broncoaspiração estava no grupo Semaglutida 6. Kobori e col. também realizaram uma análise em pacientes submetidos à EDA, com uma análise retrospectiva através de propensity match score entre 205 pares de pacientes. O grupo em uso de análogos de GLP-1 apresentou um risco de apresentar resíduos gástricos de 5,4%, contra 0,49% do grupo controle, com um p=0,004, mostrando maior risco de resíduos no grupo em uso de análogos de GLP-1. Dos 11 pacientes que apresentaram resíduos no grupo GLP-1, 2 estavam em uso de liraglutida 1,8mg ao dia,5 em uso de dulaglutida 0,75mg por semana, 2 em uso de semaglutida 0,5mg por semana e 2 em uso de semaglutida 1mg por semana. Estes pacientes utilizavam os análogos em média há 57 meses 7. Klein e Hobai descreveram um caso de um paciente de 42 anos, em uso de semaglutida para obesidade, iniciada nos últimos 2 meses, que ao fazer uma EDA para acompanhamento de esôfago de Barrett acabou sofrendo um quadro de broncoaspiração volumosa, mesmo após jejum de 18 horas, demonstrando que o esvaziamento pode estar reduzido, aumentando o risco destes eventos, apesar de ser um caso de início recente, para obesidade e com doença do refluxo gastroesofágico grave diagnosticado previamente ao uso 8. Deane e col. mostraram que o emprego de análogo de GLP-1 retarda o esvaziamento gástrico de maneira significativa naqueles indivíduos cujo esvaziamento gástrico é normal ou acelerado. Dessa forma, pacientes com DM, os quais possuem maior risco de gastroparesia, podem apresentar maior risco de broncoaspiração mesmo com a suspensão do análogo de GLP-1, sendo uma população a ser observada com maior cuidado no pré-operatório, tendo cuidado especial aos sintomas gastrintestinais, usuários de análogos de GLP-1 ou não 9.RecomendaçõesRecentemente foi publicado um consenso baseado nas orientações da American Society of Anesthesiologists – ASA 10 sobre o uso pré-operatório de agonistas do receptor do GLP-1, chamando atenção para uma associação entre a presença dos sintomas gastrintestinais no dia do procedimento (náuseas, vômitos, dispepsia e distensão abdominal) com conteúdo gástrico residual aumentado. Nesses casos foi sugerido o adiamento do procedimento eletivo. Nos pacientes sem sintomas gastrintestinais, no dia do procedimento, os quais não fizeram a interrupção da medicação no período recomendado (um dia para uso diário e sete dias para uso semanal), foi sugerido prosseguir com as precauções para “estômago cheio” ou avaliação do volume gástrico por ultrassonografia points-of-care, individualizando-se a conduta.A Sociedade Brasileira de Diabetes – SBD 11 também reuniu uma série de orientações sobre os agonistas do GLP-1 no contexto pré-operatório, sugerindo o aumento do período de suspensão da semaglutida (oral e subcutânea) para 21 dias, levando-se emconsideração a meia-vida do fármaco (7 dias) e casos não relatados de broncoaspiração grave.Considerando a existência de diferentes protocolos, os quais divergem sobre o exato período de suspensão dos fármacos, colocando como necessária a interrupção de um a cinco dias para (uso diário) e 10-14 dias (uso semanal), e que também não há estudos com um nível de evidência alto até o momento sobre o uso de tais medicações de forma segura no perioperatório, o comitê de medicina perioperatória da Sociedade Brasileira de Anestesiologia – SBA, está de acordo com a recomendação da SBD.ConclusõesDiante dos fatos expostos e da ausência de estudos com maior evidência sobre dados que norteiam o uso seguro da semaglutida no perioperatório, este comitê está de acordo com as orientações sugeridas pela SBD (suspensão da semaglutida oral e subcutânea para 21 dias).Na hipótese de suspensão da medicação, o médico assistente deve ser comunicado e realizar o ajuste do tratamento, incluindo outras classes, caso necessário, evitando a hiperglicemia, que também é maléfica neste período.Deve-se levar em conta que existem alguns estudos em andamento, os quais podem fornecer recomendação diferente, tanto mais restritiva, quanto mais liberal nos próximos anos.Comitê de Medicina Perioperatória – SBABruno Vítor Martins Santiago TSA/SBADanillo Ewerton Oliveira Amaral TSA/ SBALuiz Marcelo Sá Malbouisson TSA/SBAReferências World Health Organization. Global action plan for the prevention and control of noncommunicable diseases 2013-2020 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2013 [cited 2014 Jan 27]. 55 p. Available from: http://www.who.int/globalcoordination-mechanism/publications/globalaction-plan-ncds-eng.pdf?ua=1 Schmidt MI, Duncan BB, Silva GA, Menezes AM, Monteiro CA, Barreto SM, et al. Chronic noncommunicable diseases in Brazil: burden and current challenges. Lancet. 2011 Jun;377(9781):1949-61. International Diabetes Federation. IDF Diabetes Atlas [Internet]. 6th ed. Brussels: International Diabetes Federation; 2014 [cited 2014 Jan 19]. Available from: http://www.idf.org/diabetesatlas Malta DC, Moura L, Prado RR, Escalante JC, Schmidt MI, Duncan BB. Mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis no Brasil e suas regiões, 2000 a 2011. Epidemiol Serv Saude. 2014 dez;23(4):599-608. 5. Lynch, E., & Llano, A.. Drugs used in the management of hyperglycaemia. Anaesthesia & Intensive Care Medicine, 2022. Silveira SQ, da Silva LM, de Campos Vieira Abib A, de Moura DTH, de Moura EGH, Santos LB, et al. Relationship between perioperative semaglutide use and residual gastric content: A retrospective analysis of patients undergoing elective upper endoscopy. J Clin Anesth. 2023 Mar 2;87:111091. Kobori T, Onishi Y, Yoshida Y, Tahara T, Kikuchi T, Kubota T, et al. Association of glucagon-like peptide-1 receptor agonist treatment with gastric residue in an esophagogastroduodenoscopy. J Diabetes Investig. 2023 Mar 15; Klein SR, Hobai IA. Semaglutide, delayed gastric emptying, and intraoperative pulmonary aspiration: a case report. Can J Anaesth. 2023 Mar 28; Deane AM, Chapman MJ, Fraser RJL, Summers MJ, Zaknic AV, Storey JP, et al. Effects of exogenous glucagon-like peptide-1 on gastric emptying and glucose absorption in the critically ill: relationship to glycemia. Crit Care Med. 2010 May;38(5):1261–9. Girish P. Joshi, et al. American Society of Anesthesiologists Consensus-Based Guidance on Preoperative Management of Patients (Adults and Children) on Glucagon-Like Peptide-1 (GLP-1) Receptor Agonists. [Internet] American Society of Anesthesiologists (ASA) Task Force on Preoperative Fasting; 2023 [cited 2023 Jul 03]. Available from: https://www.asahq.org/about-asa/newsroom/news-releases/2023/06/american-society-of-anesthesiologists-consensus-based-guidance-on-preoperative. Emerson Cestari Marino, Leandra Negretto, Rogerio Silicani Ribeiro, Denise Momesso, Alina Coutinho Rodrigues Feitosa. Rastreio e Controle da Hiperglicemia no Perioperatório. Diretriz Oficial da Sociedade Brasileira de Diabetes (2023). DOI: , ISBN: 978-65-5941-622-6 .4. Malta DC, Moura L, Prado RR, Escalante JC, Schmidt MI, Duncan BB. Mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis no Brasil e suas regiões, 2000 a 2011. Epidemiol Serv Saude. 2014 dez;23(4):599-608.Com distinta consideração. Confira a nota abaixo: C2055_23-3-2-1Baixar Navegação de Post AnteriorSBA participa de evento do Ministério da Saúde sobre Segurança do Paciente em BrasíliaPróximoA sede da SBA, em Botafogo, foi iluminada com a cor oficial da campanha de segurança do paciente